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A destruição da memória

 

O Ministério da Educação e Saúde (batizado de Palácio Gustavo Capanema em homenagem ao Ministro da época), projetado em 1936 e concluído em 1945 por Lúcio Costa e uma equipe que incluía Oscar Niemeyer e vários outros (tendo Le Corbusier como consultor), deve ser contabilizado como obra-prima do movimento moderno brasileiro em termos arquitetônicos: uma obra seminal que expressa as aspirações por uma sociedade mais igualitária e justa.

Ministério da Educação e Saúde Pública, Rio de Janeiro, 1936-1945. Arquitetos Lúcio Costa, Oscar Niemeyer, Affonso Eduardo Reidy, Jorge Moreira, Carlos Leão e Ernani Vasconcellos Foto/Photo Nelson Kon [SEGRE, Roberto. Ministério da Educação e Saúde. Romano Guerra, 2013]

 

Embora as funções ministeriais tenham sido transferidas para Brasília, esta obra continua a desempenhar o papel de um monumento nacional e cívico, marcando uma época de progresso na história do Brasil. Com sua praça pública arejada, colunas monumentais que elevam a torre ao espaço, curvas sensuais, terraço cheio de plantas tropicais, vastas fachadas de vidro e grades incisivas de brise soleil, o edifício provoca um impacto direto no observador e marca uma área de importância cívica na paisagem urbana do Rio de Janeiro. Visível de longe, mesmo do mar, o prédio lembra as visões urbanas de Le Corbusier dos anos 1930, nas quais havia o anseio de harmonizar a industrialização com o mundo natural. Mais do que um edifício, o Ministério incorpora uma visão ética de melhoria social, uma espécie de utopia.

 

Getúlio Vargas e o ministro Gustavo Capanema (à sua esquerda) admiram a escultura “Mulher reclinada”, de Celso Antônio, durante a cerimônia de inauguração do prédio do Ministério da Educação e Saúde Pública, Rio de Janeiro, 3 de outubro de 1945 [Foto/Photo FGV CPDOC]

 

Este projeto surpreendente mostrou como o arranha-céu, como um tipo normalmente reservado para fins comerciais privados, pode ser modulado para lidar com o clima local e servir a uma função cívica, pública e simbólica. Combinando os talentos escultóricos de Costa e Niemeyer, as intervenções paisagísticas de Roberto Burle Marx e os mosaicos públicos de Cândido Portinari, o projeto foi concebido como uma síntese das artes que incorporam ideais nacionais ligados à abstração da natureza como chave da identidade nacional brasileira.

 

A ideia proposta de entregar esta obra-prima aos interesses imediatistas da propriedade privada constitui um ataque ideológico aos valores cívicos e à própria história da nação, mais um ataque deste regime contrário à esfera pública e aos valores progressistas em geral, seja na escala das florestas tropicais, seja no da saúde pública nacional. Tudo deve ser feito para proteger esta obra-prima universal de um ato de vandalismo que ignora os valores da memória de longo prazo na sociedade brasileira. O Ministério da Educação e Saúde – Palácio Gustavo Capanema – também constitui um importante acréscimo ao patrimônio arquitetônico universal e, como tal, merece proteção e preservação a longo prazo.

 

Ministério da Educação e Saúde Pública, Rio de Janeiro, 1936-1945. Arquitetos Lúcio Costa, Oscar Niemeyer, Affonso Eduardo Reidy, Jorge Moreira, Carlos Leão e Ernani Vasconcellos Foto/Photo Nelson Kon [SEGRE, Roberto. Ministério da Educação e Saúde. Romano Guerra, 2013]

 


 

Sobre o autor

William J. R. Curtis é historiador e crítico de arquitetura, autor de Modern Architecture Since 1900 e Le Corbusier: Ideas and Forms.

 


 

Fonte: Vitruvius

 

 

Veja mais: Plantão Palácio Capanema: siga as últimas notícias sobre o risco de venda do edifício

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