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Arquitetura em transição: a lei dos arquitetos e urbanistas

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Palestra proferida pelo Arquiteto e Urbanista Miguel Alves Pereira durante o 1º Seminário Estadual do CAU-PR – Pré- Eleitoral, realizado em Curitiba, no auditório do Museu Oscar Niemeyer, de 27 a 29 de abril de 2011.

 

 

 

Miguel Pereira foi arquiteto formado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRS. Pós-graduado pela Wright University of California, Berkeley, USA. PhD pela University of Sheffield. Ex-Diretor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília – UNB. Ex-Presidente Nacional do IAB. Ex-Vice-Presidente da União Internacional de Arquitetura – UIA. Foi professor de Arquitetura e Urbanismo da USP.

 

 

 

 

 

“É muito difícil para mim pronunciar uma oração no discurso deste Simpósio em outra condição que não a de um peso emocional muito grande. Há 52 anos, ainda muito jovem arquiteto, eu fui companheiro contumaz desta longa jornada ininterrupta, pertinaz, permanente. Tenho dito para os meus companheiros que me reservo algumas condições especiais por ser um sobrevivente que, ainda de pé neste campo de batalha, pode e deve fazer uma homenagem àqueles que já tombaram. E eu me lembro com saudade de Eduardo Knesse de Mello, Ícaro de Castro Mello, João Batista Villanova Artigas, Ary Garcia Roza, Mauricio Roberto, Carlos Maximiliano Fayet, José Albano Volkmer e Demétrio Ribeiro. Para citar aqueles que representavam e simbolizaram os valores desta grande luta.

 

Mas quero confessar para vocês que eu fiquei sabendo que ia fazer a conferência de abertura apenas hoje à tarde, quando eu cheguei a Curitiba, às 15h30. Eu teria de substituir a conferencista do representante do Ministério da Cultura.

 

E eu senti medo, mas também senti satisfação e aceitei o desafio. Afinal, eu vinha para uma festa que foi toda ela, por mais de meio século, nada mais que um desafio. Aceitei mais este.

 

E a proposta que recebi do coordenador do Simpósio era para que apresentasse hoje a Conferência que eu faria amanhã de manhã. E a gente nunca sabe o que vai acontecer amanhã de manhã.

 

A condição que contrapus foi no sentido de que eu deixaria o meu pensamento solto, e que não faria a Conferência de amanhã de manhã, porque ela é muito rude, ela é pesada, ela é impiedosa, ela é polêmica, cheia de detalhes e é longa. Então eu resolvi lembrar como nunca o meu companheiro, poeta espanhol, Antônio Machado, que sempre nos ensinou nas horas como estas: caminante, caminante, no hay camino, se hace camino al andar.

 

De modo que eu quero que vocês aceitem a minha meditação. Em função de que aqui eu vim acompanhar a todos vocês na celebração desta grande vitória e na reverência que faço a esta plêiade que acabou de ocupar esta mesa, e que é símbolo sim, da nossa força política e de nossa força cultural.

 

Parabéns ao IAB do Paraná e ao CAU Paraná, que organizam este Simpósio de lançamento de um CAU regional, que há de ser exemplo para todos os 27 estados da Nação. E que satisfação hoje ver que esta plateia está cheia, o que significa que nós tínhamos as nossas razões em sermos combatentes contumazes por mais de meio século. Porque nós queríamos conquistar uma nova condição para a arquitetura brasileira, não só a independência, mas todos os seus significados, que eu haverei de discutir hoje ou amanhã, na sequência do meu pensamento.

 

Quero frisar que esta satisfação que eu aqui sinto hoje, haverei de sentir até o meu último dia de vida.

 

Eu soube viver, soube não fugir da trincheira. Não me considero herói, mas um “maquis” da arquitetura, um resistente. E por isso eu quero falar para vocês de um desses momentos em que eu custei a acreditar: 31 de dezembro de 2010. Eu recebi um telefonema do meu companheiro Clovis Ilgenfritz, explicando como tinha sido dura a conversa de uma equipe de cinco colegas nossos vinculados aos trabalhos de discussão e construção do CAU com a Casa Civil, a fim de discutir os vetos prováveis e não prováveis e que, afinal, o Lula tinha assinado a Lei 12.378.

 

Nos primeiros dias de janeiro, no dia 3 de janeiro, eu recebi um e-mail de uma jornalista da revista Projeto, a Élide, que me fez uma pergunta contundente: e agora que o CAU está criado, o que você pensa deste fato? O que mudou na vida dos arquitetos brasileiros? Por favor, me envie seu texto o mais breve possível.

 

A ficha para mim não tinha caído, porque quem resiste e persiste durante mais de meio século, custa a acreditar que a gente tem condições e pode transformar a realidade.

 

Eu vou ler para vocês um pequeno texto que eu fiz para a Élide, porque este texto representa a síntese do meu pensamento em relação ao que nós estamos vivendo hoje. Eu escrevi: Prezada Élide, perdoe-me pela demora. Esta falta de pressa deve-se ao merecido repouso dos guerreiros.

 

Uma jornada assim de meio século, cansa qualquer maquis da arquitetura. Como sobrevivente nesta longa batalha, já temia não poder festejar esta grande vitória. A partir de 31 de dezembro de 2010 tudo mudou na vida dos arquitetos brasileiros. A alta estima e o fragor do patrimônio moral acumulados ao longo desta extenuante batalha, são os responsáveis pela alforria e a maioridade de uma profissão nascida bastarda no interior do sistema CREA/CONFEA, decretado por Getúlio Vargas em 1933. Até então sempre fomos uma profissão minoritária, humilhada e ofendida. Agora, temos o respaldo legal promulgado pelo Presidente Lula, para podermos discutir e decidir sobre a nossa prática profissional, para podermos discutir e decidir sobre a nossa formação profissional. Construiremos o nosso Código de Ética, construiremos nosso Código de Responsabilidade Técnica, queremos ser uma profissão obediente aos preceitos do Código Civil brasileiro e do Código de Defesa do Consumidor. Queremos ser uma profissão responsável perante a nação brasileira. Seremos uma profissão protegida, prestigiada e dignificada. Não haverá perdas. Os ganhos serão cotidianos e permanentes. O processo de transição do sistema CREA/CONFEA para o CAU deverá acontecer pacificamente. A batalha já está ganha, nossos experts saberão equacionar as estratégias adequadas. Não haverá dificuldades de recursos que possam ser diferentes daqueles que o próprio sistema CREA/CONFEA teve quando de sua implantação.

 

Quanto ao futuro próximo, e àquele distante, penso que o Colégio Brasileiro de Arquitetos (CBA) deva continuar desempenhando um papel fundamental de convivência entre as entidades nacionais de arquitetos: a ABAP, a ABEA, a ASBEA, a FNA e o IAB. Será a tribuna adequada no trato dos problemas comuns de nossa profissão. E explorada adequadamente sua potencialidade, poderá vir a ser a grande expressão cultural e política dos arquitetos brasileiros. Penso, finalmente, que o presidente Lula deva ser o grande homenageado pelo CBA, o Colégio das Entidades Profissionais dos Arquitetos. E assino, e continuo a acreditar, não totalmente, que nós somos os vencedores, porque a batalha recomeça.

 

Isto me fez pensar numa abordagem cheia de desafio e dúvidas, e de muitas certezas. Eu penso que devamos nos armar para pensar essa nova realidade. E eu acho que a gente deva começar pelo entendimento deste conceito tão caro às nossas especulações intelectuais, que é a modernidade: Que bicho é esse?

 

E se nós nos dispusermos a esse procedimento, nós teremos que prestar a atenção naqueles intelectuais e nossos orientadores que pensaram sobre o tema.

 

Eu me refiro em primeiro: Jürgen Habermas, ilustre filósofo ainda vivo, o “último dos moicanos” da famosa Escola de Frankfurt. E quem já não ouviu isso tantas vezes – ele afirma, e nos ensina: A modernidade é um projeto inacabado. Não fala da incompetência de terminar. É que o sentimento da modernidade não termina, nem começa. A modernidade é o passado, o presente e o futuro.

 

Em segunda instância – eu nunca me esqueço deste tipo de abordagem – de citar o ilustre intelectual americano Marshall Berman, ele que escreveu aquele belíssimo livro, que considero um dos clássicos do século XX, pelo menos para nós arquitetos, que é: “Tudo que é sólido, desmancha no ar”. Ele adverte que, ser moderno é experimentar a existência pessoal e social como um torvelinho. Ver o mundo e a si próprio em perpétua desintegração e renovação, agitação e angústia, ambiguidade e contradição. É ser parte de um universo em que tudo que é sólido se desmancha no ar. Ser modernista é sentir-se de alguma forma em casa, em meio ao redemoinho – eu diria furacão – fazer seu o ritmo dele, movimentar-se entre suas correntes em busca de novas formas de realidade, beleza, liberdade, justiça, permitidas pelo seu fluxo ardoroso e arriscado. E adverte logo em seguida no seu texto: mas, ao mesmo tempo, este torvelinho ameaça destruir tudo que temos, tudo que sabemos, tudo o que somos.

 

E assim, me armando para poder pensar, quero colocar para vocês que esta ideia central de modernidade terá de nos acompanhar no entendimento do mundo globalizado de hoje. Porque tanta gente de forma resignada aceita as condições perversas e criminosas dos procedimentos com os quais se alimenta essa globalização, como se não pudesse existir outra forma de globalização mais justa, mais humana e menos perversa.

 

Para a arquitetura também serve a lição, porque eu sempre discuti com os meus pares que se nós não prestarmos a atenção para as cinco dimensões, pelo menos como instrumento de análise e de combate, nós sucumbiremos e perderemos todos. Inclusive o que somos para esse processo devastador, deste furacão, porque nós não saberemos nos postar no olho do furacão e observar de dentro o que está acontecendo.

 

E eu tenho colocado como primeira dimensão, a Dimensão Política da Globalização. Vocês vejam bem que a ideia de Estado-Nação tem perpetuado no seu desenho geográfico. Na sua dimensão de soberania, de identidade, se apagam as fronteiras. Porque nós corremos o risco de deixar de ser Nação e aquele Estado tão reivindicado, tão lutado, aquele mínimo Estado, que há de morrer de fraqueza e de fome, não é necessário. E o que se vê hoje, é que é o Estado que tem ajudado na solução das crises, principalmente esta de 2008.

 

Nós precisamos entender de política sem sermos políticos, sem necessariamente sermos políticos, e sim por um dever de ofício cultural, saber de política e utilizar essa área de conhecimento. Por quê? Porque as democracias representativas que nós conhecemos ainda decidem o destino destas nações e o destino do mundo.

 

E nós precisamos saber disso.

 

E eu coloco a segunda dimensão, a Macroeconomia. Não precisamos ser economistas, mas temos que saber como a divisão internacional de trabalho acontece. Como a relação entre o capital e o trabalho se transforma. A hegemonia de  nações do primeiro mundo, os países emergentes e os países periféricos: como é que eles se relacionam? Qual é a nossa função? Qual é a estratégia da construção dos espaços habitados? É hora, companheiros, de colocarmos em pauta aqueles pontos fundamentais com os quais nós teremos de romper paradigmas e aceitar desafios. E daqui a pouco vou abordar este tema.

 

Penso que é obrigação nossa, termos amigos economistas, conversar muito com eles, da mesma forma e com a mesma preocupação e atenção com que ouvimos e lemos nossos filósofos, para melhor pensar a vida.

 

Eu passo para a terceira dimensão de leitura da globalização, que é a Tecnologia. A tecnologia, ao mesmo tempo que significa, e praticamente é uma difusora extraordinária da cultura por todo mundo, também escraviza os procedimentos na divisão do trabalho, na relação capital e trabalho. Nós vemos a diferença do modelo de operário, de funcionário, que estamos acostumados a ver – que é o tempo integral, que é o funcionário que tem seus horários – para aquele outro operário, que não tem horário, mas que vive de plantão, principalmente nas áreas da computação e da comunicação.

 

Já há uma enfermidade da ocupação. Nós somos dominados por este trabalho, por esta disponibilidade tecnológica de poder trabalhar em qualquer parte, qualquer lugar, em qualquer país, para qualquer cliente.

 

Nós vemos também, através da tecnologia, as distâncias sumirem. A velocidade se encarrega disso em função das máquinas mais sofisticadas. O tempo nós vemos se transformar em real, em instantâneo, podendo ver o que acontece em qualquer parte do mundo no mesmo momento em que o fato acontece. Um enorme paradoxo, mas uma realidade angustiante. É nesse mundo em que o futuro se transforma em ontem, que da noite em que você dorme, para a madrugada na qual você acorda, você já desperta ignorante. Porque o avanço vertiginoso deste furacão é incontrolável, ou tem sido incontrolável.

 

Nós vemos pela tecnologia a invasão do nosso corpo, da nossa vida. Para quem leu George Orwell, em 1984, sabe que ele – o olho – está presente. Que há um olho cuidando e controlando todos, em todas as horas e em todos os lugares. Onde está o livre arbítrio? Onde está a autonomia? Onde está a liberdade? Como equacionar uma sociedade com estas características? Este é um grande desafio. E a arquitetura tem que ser pensada também com esta dimensão.

 

E eu chego naquilo que me faz aqui pensar que mesmo que de fato, eu estou substituindo a representante do Ministério da Cultura. Até porque seria uma homenagem ao Ministério, que não é tão velho assim. Vejam bem que cultura sempre foi uma coisa negligenciada neste País. O Ministério da Cultura só passou a existir na reabertura democrática de 1985. E que dentre os ministros que nós conhecemos, tranquilamente poderíamos homenagear Antônio Houaiss, meu amigo particular, intelectual sem nenhum favor, e que sentou lá na cadeira de Ministro e deu os primeiros passos para o desenvolvimento do Ministério da Cultura. Também conheci os mais recentes, o Gilberto Gil, o Juca Ferreira. Não conheço a atual ministra, mas sei muito bem da sua família, os Buarque de Holanda, que têm engrandecido tanto e tão bem o patrimônio da cultura brasileira. Nós poderíamos sim, homenagear essa família. Uma pena que a ministra não esteja aqui conosco para, de corpo presente, eu dizer que ela representa uns dos maiores desafios da Arquitetura e Urbanismo, no sentido de mudarmos o discurso genérico em relação à cultura, para transformá-lo em espaço construído, no direito à cidade e à arquitetura.

 

Mas essa cultura corre perigo, não só a brasileira, mas toda cultura, porque ela se propaga de forma tão rápida pelo mundo todo que tende a se uniformizar. É um discurso único, é a forma única rompendo e destruindo a identidade, a identidade arquitetural, a identidade cultural de um povo, e assim por diante.

 

É preciso prestar a atenção para esta fragilidade que nos coloca a globalização, e como nos comportamos em relação a isso. Nós vivemos hoje num mundo da arquitetura. Já vivemos no século passado o International Style, em que se propunha a mesma linguagem para qualquer parte do mundo. E a partir daí foi a referência básica para a contestação dos princípios básicos do Movimento Moderno.

 

Passou-se pelo Pós-Modernismo, mas o Pós-Modernismo não foi muito diferente. E hoje nós vemos a alegria e o assanhamento de outros países, principalmente os europeus, que estão cheios de dificuldades, em relação a sua curiosidade no que diz respeito ao desenvolvimento brasileiro. Todo mundo quer vir para cá por causa da Copa, por causa das Olimpíadas. Eu recebo vários e vários e-mails de arquitetos europeus querendo saber o que é preciso fazer para vir para cá. Eu juro para vocês, eu não respondo, eu não respondo. Porque as perguntas que eu sempre tive em relação a Europa, EUA, etc., e mesmo ao Japão, nunca foram respondidas. Como esta: como nós seríamos recebidos para trabalhar no país deles? Nesse sentido, ou há reciprocidade, ou não há solidariedade. É uma troca, um aspecto sadio do mercado, é a troca legítima, não de favores, mas de direitos profissionais que ao irem para outro país terão a obrigação, como preceitua a União Internacional de Arquitetos (UIA), que os aspectos culturais devam ser respeitados onde nós estivermos trabalhando.

 

Se nós pensarmos em arquitetura como produto cultural, nós teremos certeza de que isto acontecerá. Se nós pensarmos em arquitetura como uma mercadoria, como uma prestação de serviço, estes outros valores que caracterizam uma civilização, uma nação, um povo, uma região, irão para o “beleléu”, podem ficar certos.

 

E cultura é uma área tão familiar aos Arquitetos, mesmo que tenhamos pouca contribuição ainda dos nossos cinco séculos de história.

 

E nessa área onde a arquitetura atinge a sua expressão máxima, é só olhar para o resultado do processo civilizatório da humanidade. As referências não são só a natureza, mas o espaço construído é o testemunho maior, porque ele é inventivo, porque ele é criativo e se apresenta sempre de formas novas.

 

Mas eu quero falar da última dimensão – que não há de ser a última -, e quero ser até um pouco bíblico, porque quero dizer que os últimos serão os primeiros. Eu quero que a minha profissão, que a nossa profissão, saiba se situar num mundo moderno, num mundo globalizado. E saiba conceber não só o espaço construído habitável, mas também saiba respeitar e trabalhar com aqueles que usam esse espaço. Eu penso que nós teremos de meditar um pouco sobre a nossa profissão, em relação a que estrutura mais adequada poderíamos conceber para entregar ao centro produtor do conhecimento arquitetônico – que é a Universidade. A Universidade Brasileira, como seria?

 

E eu penso aqui comigo que eu dei sete nomes, sete temas para a gente poder pensar nisso. O primeiro, a Competência Fundamentada em Conhecimento Teórico. Isto significa que é preciso pensar sobre aquilo que nós fazemos, em todas as suas dimensões, até nessas que eu acabo de citar.

 

O ponto dois, o tema dois: Infraestrutura de Treinamento e Educação. É dentro da Universidade. São as faculdades de Arquitetura.

 

O espaço construído. É só querer saber e fazer uma pesquisa, um levantamento de como é que são os espaços arquitetônicos onde se ensina a arquitetura? Com raríssimas exceções, tudo é porcaria.

 

Vejam bem, quando nós pensamos na grande reforma de ensino da arquitetura que aconteceu nos anos 60, tudo começou no Rio de Janeiro, São Paulo, Porto Alegre e no Ceará. Em 1960, o Villanova Artigas que participou desta campanha, concebeu dentro destas nossas preocupações o edifício da FAU-USP. Ele foi projetado em função do que nós pensávamos, do que cogitávamos sobre o que é um ateliê de projeto, onde se faz projeto. Vão lá na FAU. A ideia que nós tínhamos era que este local devia ser uma praça aberta sem limites. Para que todos os níveis do Curso pudessem dialogar de igual para igual, que se montassem equipes interdisciplinares com diferentes níveis de aprendizado, para que uns fossem professores dos outros. E o edifício está lá.

 

A Faculdade de Arquitetura do Fundão – Ilha do Fundão -, do Rio de Janeiro, foi concebida também para ser uma Faculdade de Arquitetura, mas num tempo anterior. Foi Jorge Machado Moreira que concebeu aquele prédio tecnicamente perfeito, mas que depois que a reforma começou a se implantar na área da arquitetura, as paredes começaram a cair, a serem eliminadas.

 

Porque os ateliês de arquitetura tinham 14 pranchetas. Então as salas de aulas tinham que ter 14 pranchetas e não era verdade, não era verdade.

 

Por isso eu penso que este item dois é muito importante: pensar sobre o espaço construído, o seu significado e os seus compromissos.

 

O terceiro tema: Mecanismo de Teste da Competência Profissional. Uma escola que não se preocupou, pública ou privada, por colocar como exemplo o espaço construído do ensino da arquitetura, merece todas as dúvidas. Inclusive na qualidade do diploma. Nenhuma escola está livre de verificação de competência, no sentido de que a habilitação profissional possa ser concedida. Que não pode ser uma habilitação concedida pelo poder universitário e sim independente. E são essas cinco entidades que se sentaram aqui. As nossas cinco entidades. O CBA que tem que dar a opinião profissional da competência profissional, porque é independente.

 

O tema quatro: Organização Representativa. Vocês viram que o CAU precisou desta organização representativa. Nós sentimos no início dos anos 70 que o IAB sozinho não podia vencer todos estes obstáculos. Mas como não tínhamos o talento do Carlos Drummond de Andrade em conceber o seu poema “Tinha uma Pedra no Caminho” – ele sabia desviar dessas pedras, nós batíamos com a cara nas pedras – então criamos os sindicatos, criamos a Associação Brasileira de Escolas de Arquitetura, depois de Ensino de Arquitetura, a ABEA, as ASBEA, a ABAP, as cinco entidades. Que felizmente hoje trabalham em conjunto, na sua diversidade, na sua identidade até ideológica.

 

Mas o segredo da força política e cultural é trabalhar neste plano, admitindo sempre que o CBA é uma tribuna aberta e vencerá quem for mais competente. Não vale a fofoca, não vale a briga, a picuinha gratuita. A convivência é solidária. E que vivam, e muito, as entidades nacionais dos arquitetos brasileiros.

 

O tema cinco: Regulamentação. Sabem que no governo do Fernando Henrique Cardoso havia uma medida provisória que tentava “desautarquizar” as autarquias, é claro, desregulamentando os Conselhos Profissionais. Era a famosa desregulamentação proposta pela Organização Mundial do Comércio (OMC), a fim de facilitar os acessos à transposição das fronteiras das nações e dos estados. Para que, em aqui não havendo regulamentação, todo mundo poderia chegar como se fosse a casa da mãe Joana, e trabalhar onde quisesse. Isso felizmente não aconteceu.

 

Foi o início da unidade, da consciência da unidade das cinco entidades nacionais de arquitetos. Por isso nós percebemos que a partir daí a nossa luta recrudesceu, ficou mais robusta, e deu o que deu: 31/12/2010, a Lei 12.378 é realidade. Nós somos independentes, nós somos donos do nosso nariz!

 

O tema seis: Estrutura Ética. É mais do que necessário porque, coitada da nossa profissão, tem vivido, percebido e sofrido e se angustiado com uma ética igual a zero. Prejudicando o trabalho profissional, a relação entre os profissionais sem proteção legal. E nós, por isso, teremos de muito bem conceber e desenvolver aquilo que a nossa própria Lei já tem como recomendação e garantia desta preocupação: precisamos ser éticos!

 

E o último tema – talvez não seja o último – é, e seria, a Educação Permanente. Quando penso nesse tema sempre me dou conta de que muita gente se engana com o próprio talento. Nenhum talento resiste cinco anos sem qualquer atualização ou estudo. Sucumbe, se mediocriza. Só quem não se mediocriza são os gênios. E no Brasil, que eu saiba, no plano da arquitetura, só existe um, chamado Oscar Niemeyer. Então, a educação permanente é necessária.

 

Se nós concebermos assim a profissão, se nós tivermos uma imagem teórica, cultural, universitária – essa estrutura – nós poderemos discutir e decidir sobre a formação profissional. E essa formação profissional poderá, pela sua qualidade, saber trabalhar com as fronteiras do conhecimento: a inovação, a criatividade, os grandes desafios. Quando eu falei em quebra de paradigmas, eu acho que o desafio está aí. A arquitetura brasileira é que nós já não sabemos tão bem como nós fazíamos em 1950. Nós sabemos, Brasília foi o estertor de uma grande fase brasileira. E agora José? Então, este é um aspecto.

 

A Lei de Assistência Técnica é um desafio gigantesco. É um desafio que propõe um convívio solidário entre profissionais e população usuária. Quando é que nós vamos permitir que o usuário seja coautor daquilo que nós fazemos?

 

Vejam como o Ministério da Cultura hoje se preocupa com uma certa flexibilização da Lei de Proteção do Direito Autoral. Que significaria o direito autoral num país como o nosso em que ainda hoje temos dezesseis milhões de miseráveis, que certamente não terão onde morar, ou a maioria não terá onde morar?

 

Como é que nós, no plano da educação, da arquitetura, poderemos transmitir e colocar estas representações? Como eu pessoalmente já vi em outros países da América Latina essas comunidades serem convidadas para frequentar ateliês de arquitetura. No Equador eu vi isso nos anos 70. Havia lá o pessoal discutindo os programas, discutindo os projetos etc. Era uma época em que a gente vivia a influência, a inspiração da conhecida, conhecidíssima Primavera de Paris de 1968. Tivemos “n” experiências, a nossa experiência. A nossa reforma do ensino da arquitetura tem muito daquela revolução universitária da França nas propostas que fizemos.

 

Aí eu penso na qualidade do projeto. Penso em todos aqueles arquitetos que sempre lutaram por isso, desde o Lelé, o João Filgueira Lima, que sempre fez uma máxima qualidade num plano de modéstia irreconhecível no resto da produção arquitetônica brasileira. Um pioneiro extraordinário na arquitetura sustentável, e muito pouca gente fala dele. Mas ele é o pioneiro.

 

O Abrahão Sanovicz, lá de São Paulo, se angustiava, sofria, escrevia sobre a qualidade do projeto.

 

Isto para falar que, o outro grande desafio, são as políticas públicas que estão aí e que nós não sabemos responder, nem ajudar a resolver. Que é o programa Minha Casa, Minha Vida. O Lelé se referiu criticamente a esse programa, mas creio que numa vontade enorme de ajudar: esse programa é uma porcaria. Por quê? Porque ele está sendo administrado pelas grandes empresas, pelas empreiteiras. E que se produza o que se quiser. E o que se produz hoje não é superior ao que se fazia no BNH nos anos 60, é a mesma porcaria.

 

Agora nós somos culpados disso, porque nós, desde 1954, no 4º Congresso Brasileiro de Arquitetos – realizado em São Paulo para celebrar o 4º Centenário da Cidade – já reivindicávamos a criação do Ministério do Urbanismo. Pois bem, o doutor Lula criou o Ministério das Cidades. E nós temos uma relação aberta com ele, porém muito modesta. Nós precisaríamos fazer propostas mais veementes para o Ministério das Cidades e botar a boca no trombone. Porque não dá para fazer isto que está sendo feito neste Programa que poderia ser tão lindo. Até porque o direito à cidade preceitua que todos os cidadãos brasileiros têm direitos à beleza.

 

E eu termino aqui, dizendo que sou um admirador, respeitador, defensor da permanência do Colégio Brasileiro de Arquitetos.

 

Eu acho que o CAU/PR vai precisar, nos próximos anos, do trabalho arguto e vigilante desta plêiade, desse conjunto de entidades nacionais de arquitetos que, ao se unirem, se transformam em algo poderoso e significativo.

Oxalá permaneça o CBA por muitos anos. Muito obrigado”.

 

Curitiba/Museu Oscar Niemeyer, de 27 a 29 de abril de 2011.

 

Da esquerda para a direita, Miguel Pereira, Jeferson Dantas Navolar, Mirna Cortopassi Lobo e Clóvis Ilgenfritz.

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