ARQUITETURA SOCIAL

Assistência Técnica: Arquitetos e urbanistas apresentam soluções inovadoras

 

 

Arquitetos e urbanistas de várias partes do país apresentaram experiências pioneiras de atuação junto a famílias de baixa renda que precisam melhorar a qualidade de suas residências. Essas ações fizeram parte da programação do Seminário de Assistência Técnica em Habitação Social, realizado no dia 15 de agosto em Brasília pelo CAU/BR e pelo CONFEA. O panorama apresentado inclui atividades realizadas por governos, empresas, universidades e organizações não-governamentais, mostrando que a diversidade de atores e metodologias usadas para combater os problemas de moradias que afetam a qualidade de vida de milhões de brasileiros.

 

Pesquisa do CAU/BR mostra que 85% da população que constrói ou faz reformas no Brasil não utiliza os serviços de arquitetos e engenheiros – profissionais legalmente habilitados para esse tipo de serviço. Para enfrentar esse problemas, os participantes do evento propuseram novas experiências, fora dos padrões realizados até aqui. “Se a gente se colocar dentro dos moldes e dos critérios atuais, nós não vamos resolver o problema. Para fazer Assistência Técnica, temos que criar novos caminhos jurídicos, novos caminhos contábeis. E nós arquitetos temos que sair das nossas cadeiras e ir para a ponta, para a periferia, afirmou Gilson Paranhos, presidente da Companhia de Desenvolvimento Habitacional do DF (CODHAB-DF). Saiba mais aqui. 

 

A CODHAB-DF possui 12 postos de Assistência Técnica na periferia de Brasília, com mais de 15.600 projetos realizados e 80 ações comunitárias. “Temos que combater o déficit habitacional qualitativo, resolvendo o problema da pessoa humana. Só assim Brasília vai parar de direcionar os problemas do Rio Grande do Sul da mesma forma que no Amazonas, no Nordeste”, diz Gilson. O empresário do Programa Vivenda, Fernando Assad, que realiza reformas pequenas na periferia de São Paulo, concorda. “Queremos desenvolver um mercado para a baixa renda. Nossa premissa é que você tem que estar dentro do território”, afirma. Clique aqui para conhecer como funciona o programa. 

 

Posto de Assistência Técnica da CODHAB-DF em Brasília

 

NOVAS FÓRMULAS E DESAFIOS
A arquiteta Mariana Estevão desenvolve o projeto Arquiteto de Família a partir dessa mesma premissa. O Arquiteto de Família é uma tecnologia social certificada pela Fundação Banco do Brasil e premiada em 2013 pela Finep (Empresa Brasileira de Inovação e Pesquisa). Sua atuação segue a estratégia do Saúde da Família, com profissionais agindo permanentemente no mesmo território, interferindo na cultura da autoconstrução e sensibilizando a população sobre a necessidade de investir em melhorias habitacionais. Clique aqui para saber mais. 

 

Mariana destaca que o investimento em habitação pode prevenir outros gastos, como em saúde. “No Congresso Nacional de Saúde Ambiental ficou claro que os principais problemas de saúde estavam relacionados a ausência de infraestrutura e problemas habitacionais”, disse. Segundo ela, 25% das internações por traumatismo craniano são causadas por queda da laje. Sendo que cada internação passa de R$ 16.000 de custo. Fernando Assad destaca que as reformas feitas pela Vivenda são mais caras que o padrão pago pela Caixa, uma vez que usam critérios e métricas diferentes.

 

“Chegou a hora de pensarmos soluções de maioridade, não de puxadinho”, afirmou. “Não é porque é para a população de baixa renda que tem que ser feito por recém-formado, que não é para ganhar dinheiro”. O Vivenda vende a solução toda, com arquiteto, material, mão de obra e financiamento. Com essa proposta, já foram feitas mais de 800 reformas em São Paulo, a um custo médio de R$ 5.900 e parcelas a partir de R$ 100.

 

Loja do Programa Vivenda em São Paulo

 

REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA
Outro aspecto da Assistência Técnica tratado no Seminário foi a regularização fundiária, por meio do Projeto Moradia Cidadã, realizado pela Universidade Federal do Pará (UFPA). O projeto lida principalmente com ocupações em antigas áreas da União que foram repassadas ao municípios recentemente. São mais de 500 núcleos urbanos em mais de 127 municípios. “A ênfase é no direito à moradia, e não o direito à propriedade”, afirma a arquiteta Myrian Cardoso, professora da UFPA. Os objetivos são permitir o acesso dos moradores a programas sociais, resolver conflitos, valorizar a organização social, a expressão cultural e principalmente garantir o direito de permanência dos moradores na propriedade. “O morador tem a necessidade de se sentir cidadão e pertencer à cidade formal”.

 

O projeto conta com um sistema de Georreferenciamento, que gera os documentos necessários para o morador conseguir retirar a sua escritura no cartório. “Um ex-morador de rua, ao receber sua unidade, ligou para o filho e o convidou para visitá-lo, que agora ele já tinha endereço”, disse Myrian. Gilson Paranhos destaca que também na área de regularização fundiária é preciso estabelecer novos parâmetros condizentes com a realidade da população.

 

“Temos um problema básico no Brasil que é a densidade, sem isso não vamos resolver nem mobilidade, nem saúde e nem educação. Quando a gente pega os mapas de educação, o espraiamento no país é absurdo”, afirmou, dando exemplo de uma discussão que teve com movimentos sociais. Segundo Gilson, o movimento queria um lote de 15m de frente, enquanto ele propunha 7,5m. “Na Asa Sul, as casas das 700 têm 6m de frente, é por isso que é patrimônio da humanidade. No Chile, o Alejandro Aravena, ganhador do Priztker, fez casas com 3m de frente”, disse. “Quanto custa uma infraestutura de 3m e quanto custa uma infraestrutura de 15m?”, questionou.

 

As arquitetas Myrian Cardoso, da UFPA, e Mariana Estevão, do Arquitetos de Família

 

O QUE FOI FEITO ATÉ AGORA
Os debates do Seminário de Assistência Ténica em Habitação Social também contaram com um histórico da Assistência Técnica em Habitação de Interesse Social, apresentado pelo vice-presidente do CAU/BR, Guivaldo Baptista. O começo teria sido com a Vila Operária de Salvador, construída no fim do século XIX. A Vila, com 258 habitações, foi obra do empresário Luiz Tarquínio, neto de escravos, que entendia a necessidade de proporcionar qualidade de via a seus funcionários. Essa “linha do tempo” da Habitação Social segue com a criação do Banco Nacional de Habitação (BNH), em 1964, e chega em 1976 com a primeira experiência de Assistência Técnica: o Programa de Moradia Ecônomica de Porto Alegre, coordenado pelos arquitetos Clóvis Ilgenfritz da Silva, Newton Burmeister, Carlos Maximiliano Fayet e Claudio Casaccia e os advogados André da Rocha e Madalena Borges.

 

“O Sindicato dos Arquitetos disponibiliza 70 jovens profissionais, cada um com a responsabilidade de atender a dez famílias”, disse Guivaldo. Em 2005, a Lei 11.124 cria o Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social e o Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social – este último ainda não implantado. Em 2008, é promulgada a Lei de Assistência Técnica para Habitação de Interesse Social (Lei 11.888), apresentada pelo então deputado Zezéu Ribeiro, arquiteto e urbanista de profissão. Em 2009, começa o programa Minha Casa Minha Vida.

 

Em 2014, o CAU/BR aprova a Resolução CAU/BR Nº 94, de apoio a Assistência Técnica. “Neste ano, já são destinados R$ 150.000 para apoio a essas atividades. Foi assinado um contrato com o Projeto Canhema, que atende a 90 famílias de baixa renda em São Paulo”, diz Guivaldo. Em 2017, o CAU/BR determina que 2% dos orçamentos de todos os CAU/UF sejam alocados para apoiar ações de Assistência Técnica (leia aqui). “Isso passa a ser uma diretriz orçamentária”. Mais recentemente, a Comissão de Política Profissional (CPP) do CAU/BR passar a monitorar as ações de diversas iniciativas no Brasil, como os programas Vivenda, Arquiteto de Família, Inova Urbis e outros.

 

O 1º vice-presidente do CAU/BR, Guivaldo Baptista, apresentou um histórico da Assistência Técnica no Brasil

 

PROPOSTAS PARA O FUTURO
O Seminário teve como objetivo principal levantar propostas para um modelo nacional de assistência técnica em habitação social para ser aplicado em 200 cidades brasileiras, por meio do programa Cartão Reforma. Realizado pelo Ministério das Cidades, o programa fornece materiais de construção e assistência técnica especializada para famílias que desejam construir ou reformar sua moradia. As famílias com renda mensal de até R$ 1.800 recebem crédito de até R$ 7.500 para compra de materiais de construção em lojas cadastradas junto ao Ministério das Cidades – não vale para contratação de mão de obra. A necessidade de novas propostas deve-se ao pouco impacto alcançado até aqui com iniciativas anteriores.

 

Incluídos no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) do governo federal, os projetos para prestação de assistência técnica (ATHIS) apresentaram uma “taxa de mortalidade” bem acima da média das demais modalidades de soluções para moradia para população de baixa renda. Foi o que informou a arquiteta e urbanista Mirna Quinderé Belmiro Chaves, diretora do Departamento de Melhoria Habitacional, da Secretaria Nacional de Habitação, do Ministério das Cidades. Dos 903 projetos ATHIS selecionados entre 2007 e 2013, 730 foram cancelados, ou seja, 81%. Em valores, dos R$ 118 milhões empenhados, foram usados apenas R$ 78 milhões, o que equivale a 66%. A média de cancelamento, considerando todas as modalidades, é de 38% em quantidade de projetos e 32% em recursos financeiros.

 

“O Ministério das Cidades já entende que a gente precisa revisar esse modelo do Cartão Reforma”, afirmou a conselheira Josemée Gomes, coordenadora da Comissão de Política Profissional (CPP) do CAU/BR. “Precisamos pegar essas informações e discutir com o Ministério e com a Caixa para fazer valer as nossas propostas”. O presidente do CAU/BR, Luciano Guimarães, acredita que as discussões darão bons frutos em um futuro próximo. “Pressenti que este Seminário faria história. Ouvi propostas fantásticas que não podem se perder. Temos que dar o passo seguinte”, afirmou, destacando a proposta de criar um “SUS da Habitação Social”, uma Política de Estado, como parte do direito social à moradia previsto na Constituição. “Temos que mostrar para a sociedade a função social das nossas profissões”, afirmou.

 

Da esquerda para a direita: Nivaldo Andrade, coordenador do Colegiado de Entidades Nacionais de Arquitetos e Urbanistas; Luciano Guimarães, presidente do CAU/BR; Fátima Có, presidente do CREA-DF; Silvani Pereira, secretário-executivo do Ministério das Cidades; Edson Delgado, vice-presidente do CONFEA; e Wilson Lang, coordenador do Colégio de Entidades Nacionais de Engenharia

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