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Bairros Históricos: Fortalecimento Territorial, Institucional e Gestão

“Fortalecimento territorial, institucional e gestão” foi o tema da primeira mesa de debates do “Seminário Internacional Gestão Inovadora de Bairros Históricos” no dia 10 de setembro de 2018.

 

O evento, que se estendeu até o dia 11, foi promovido pela Comissão de Relações Internacionais do CAU/BR, em co-realização com o CAU/SP e o curso de pós-graduação de Arquitetura e Urbanismo da FAU da Universidade Mackenzie, como apoio da CAPES.

 

Nessa página você encontra uma síntese das palestras e debates, as íntegras das apresentações, vídeo e entrevistas.

 

ALAIN LIPIETZ 

 

(Engenheiro pela Politécnica de Paris, foi Diretor do CEPREMAP – Centro de Pesquisas em Economia. Foi durante 10 anos deputado europeu pelo Partido Verde e coordenador adjunto do parlamento Euro-latino americano. Especialista em macroeconomia, políticas sociais, urbanas e regionais, economia internacional e ecologia, escreveu 20 livros)

 

Alain Lipietz

 

Segundo Alain Lipietz a perda da memória material ou imaterial de uma cidade equivale a um exílio. Para o poeta Charles Baudelaire, esse sentimento se manifestava como uma melancolia em razão das mudanças de paisagem que Paris vivera após as obras de renovação da cidade empreendidas pelo Barão de Hausmann, a mando de Napoleão, construindo largas avenidas ou boulevares e destruindo velhos bairros. Mas há outro tipo de exílio além do estético, como revelaram na França artistas como a cantora popular Fréhel, cujas canções do início do século XX ressaltavam as perdas das relações sociais, em especial da classe trabalhadora.

 

Ao historiar as mudanças urbanísticas pelas quais Paris passou no século XX, o palestrante ressaltou que os “exílios” seguem existindo.  Um exemplo: após a Segunda Guerra, lembrou ele, os antigos bairros populares da capital francesa começaram a atrair a boemia. “As classes intelectuais tendem a ocupar esses bairros, jogando a população para fora”, pontuou Lipietz. Para o especialista, existe a necessidade de renovar sem excluir. “É preciso pensar nos espaços da comunidade, nos espaços verdes e, principalmente, nas periferias da cidade”, concluiu.

 

Clique no link para acessar o ppt da apresentação de Alain Lipietz

 

HENRY RUSSELL 

 

(Historiador de Cambridge, trabalhou 25 anos no campo do Patrimônio para ingressar na carreira de altos estudos de Educação voltados para Preservação e Conservação Histórica nas Universidades de Oxford e Reading. Envolvido com a política Nacional de Patrimônio Histórico, faz parte do quadro dirigente do grupo “Heritage Alliance Spatial Planning Advocacy”, do Reino Unido)

 

Henry Russel

 

Segundo Henry Russell, “todo mundo tem direito ao patrimônio, pois ele diz respeito à identidade e à cultura” e por isso é necessário que a sociedade mobilizada e organizada trabalhe para a preservação da memória das cidades. 

 

No Reino Unido, afirma, o país se vale de várias instituições – como loterias, proprietários de moradias antigas urbanas e rurais, entre outras – para fortalecer os programas de preservação.

 

As doações para o setor vêm, na sua maioria, do setor público, mas também surgem eventuais doadores de caridade e de corporações. Russell explica que o país conta com aproximadamente 4.500 edifícios tombados. “A chave é fazer com que o governo adote as políticas públicas. O governo nos escuta porque somos um setor amplo”, aponta o pesquisador.

 

Henry Russel falou também do Heritage Lottery Fund, que tem viabilizado arcar com  377 mil edifícios históricos britânicos (apenas uma parte tombada), além de quase 20 mil monumentos, 1.652 parques e 46 campos de batalha preservados.

 

De cada 2 libras gastas no bilhete de apostas, 28% vão para financiar “boas causas”, entre elas, a preservação, que fica com 20% do total arrecadado para esse item. O valor varia conforme o volume de apostas, mas fica em torno de 300 milhões de libras por ano (ou 1,6 bilhão de reais). O Heritage Lottery Fund foi criado em 1994 e desde então já arrecadou quase 8 bilhões de libras para projetos de tamanhos variados.

 

Outra fonte importante de recursos é o Historic England, órgão criado em 2015 e subordinado ao Ministério da Cultura, Mídia e Esportes. Seu orçamento anual é de cerca de 90 milhões de libras, o equivalente a 500 milhões de reais. E mesmo assim a preservação do patrimônio britânico depende também de doações privadas, feitas por empresas e instituições filantrópicas.

 

Clique no link para acessar a apresentação de Henry Russel

 

Clique no link para acessar entrevista de Henry Russel e Michael Ball  ao Esquina

 

 

EDÉSIO FERNANDES 

 

(Jurista brasileiro vive em Londres há 30 anos, é professor da University College London (UCL) e do Lincoln Institute of Land Policy nos Estados Unidos. Foi durante 25 anos consultor de inúmeras ONGs e de governos, como Unesco, UN Habitat  ,FAO, Banco Mundial voltados para Políticas no Brasil, América Latina, África  e países do leste europeu. Publicou inúmeros artigos e livros em diversas línguas)

 

Edésio Fernandes

 

Edésio Fernandes falou sobre a questão da governança no Patrimônio. Ele lembrou que a história das políticas da proteção da memória urbana revela uma busca constante de equilíbrio entre conceitos, normas, instrumentos em todo mundo os conceitos, normas, instrumentos, processos, ações e práticas, bem como capacidade de gestão e recursos financeiros.

 

“Existem dificuldades históricas de assimilação das políticas por proprietários de imóveis, mercados imobiliários, gestores públicos, comunidades e sociedade em geral. São conflitos renovados e crescentes, o que tem levado a uma crise generalizada das políticas e do modelo tradicional de governança do Patrimônio. É uma questão internacional, não só brasileira”.

 

A busca de novas estratégias precisa ir, segundo ele, além da ação estatal, uma vez que o problema da preservação cultural é parte da falência do modelo neoliberal da ocupação do espaço da cidade na atualidade, o que tem sido objeto de questionamentos profundos e novas formas de mobilização social.

 

O marco conceitual para essa busca, diz o jurista, deve ser o “Direito à Cidade”, lançado em 1968 pelo filósofo e sociólogo francês Henri Lefebvre, para quem o direito de fazer e refazer nossas cidades depende do exercício de um poder coletivo para dar nova forma ao processo de urbanização. “Esse conceito em grande medida se perdeu na França, mas sobreviveu no Brasil, daqui passou para a América Latina e hoje ganhou o mundo na medida em que foi incorporado recentemente na Nova Agenda Urbana da ONU”.

 

Nessa perspectiva, para Edésio Fernandes é necessário inserir a questão da proteção do Patrimônio no âmbito das questões urbanas e socioambientais contemporâneas, como moradia, economia criativa, agricultura urbana, retomada dos centros e dos espaços públicos. “Mais do que uma “ política pública”, o desafio é criar uma ampla “cultura pública” da proteção  do Patrimonio Cultural”.

 

Essa mudança, reconhece, é tensa, pois exige equilibrio permanente entre coerção e estímulo, reação e ação proativa. “A nova abordagem somente vai ganhar solidez quando se tornar “externalidade positiva” para atores,  especialmente quando vista também como agregadora de valor socioeconomico para donos de imóveis,  para cidades (turismo, serviços, empregos, impostos), e para comunidades e sociedades (coesão, saúde, fruição)”.

 

Os desafíos a serem enfrentados passam por uma articulação de instrumentos jurídicos, financeiros-tributários e urbanísticos e uma justa distribuição de ônus e beneficios, inclusive da valorização imobiliária. “A realidade é que não dá para desapropriar tudo, nem tudo pode ou deve virar centro cultural. O tombamento é complicado e os custos de manutenção não podem mais serem ignorados”.

 

O olhar técnico não é suficiente para legitimar e consolidar a “cultura do patrimonio”, segundo Edésio Fernandes. É necessário envolver um público mais amplo, planos  comunitários, iniciativas populares de diversas ordens e participação efetiva  – “de todas as formas” -dos interessados em todas as etapas.   “A cidade é uma construção coletiva, idem o Patrimônio”, ressaltou Fernandes.

 

Ações pontuais de “acupuntura urbana”, afirmou o especialista, oferecem oportunidades para preservação do Patrimônio Cultural e podem servir como âncora para a reinvenção da cidade, “materializando o Direito à Cidade”. Nesse sentido, ele ressaltou que o papel dos jovens, na liderança do processo, é fundamental.

 

 

 Clique no link para acessar a apresentação de Edésio Fernandes

 

 DEBATES

 

Durante os debates, Leonardo Castriota, do Instituto de Estudos de Desenvolvimento Sustentável da Universidade Federal de Minas Gerais, disse que o incêndio no Museu Nacional impactou a população, e que deve contribuir para o debate sobre a preservação do patrimônio histórico. “Eu vejo a possibilidade de uma ação direta da sociedade para enfrentar essas dificuldades”, disse.

 

Nivaldo Andrade, presidente do IAB/DN, ressaltou a necessidade de empregar ferramentas para manter o patrimônio cultural. “O IAB está propondo a criação de um fundo específico para o setor”, anunciou.

 

Hélio Costa Lima, conselheiro federal do CAU/BR pela Paraíba, destacou que é preciso ampliar o debate sobre o tema. “A questão do patrimônio não deve permear somente os arquitetos e urbanistas. Precisamos da mão de outros especialistas”, disse.

 

Os arquitetos Silvio Oksman (Escola da Cidade) e Vanessa Bello (conselheira do CAU/SP) foram chamados para a fase de comentários da mesa.

 

Bello afirmou que é necessário pensar em preservação do patrimônio no âmbito de uma política urbana territorial. “Não estamos acostumados a fazer planos regionais nem considerando o ambiental, o urbano, ou as relações de economia regional; então, colocar a cultura e o patrimônio nesse ingrediente vai ser mais um desafio”, ponderou.

 

Oksman trouxe a tragédia do Museu Nacional no Rio para o debate sobre financiamento. “Eu, mais do que arrisco, eu afirmo sem o menor medo que não falta dinheiro, definitivamente não falta dinheiro; o que falta é gestão e organização para esse dinheiro chegar aonde precisa chegar”, ponderou.

 

Assista ao vídeo das palestras da manhã do dia 10 de setembro:

 

 

Veja mais: Bairros Históricos: Financiamento e sustentabilidade do Patrimônio

 

 

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