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Carta aos Candidatos propõe que políticas públicas foquem nas pessoas

Pessoas no centro das políticas, dos programas e projetos urbanos de curto, médio e longo prazos é uma das cinco propostas fundamentais da recém lançada “Carta-Aberta à Sociedade e aos Candidatos para as Eleições de 2020 – um projeto de cidades pós-pandemia”, elaborada pelas entidades de Arquitetura e Urbanismo do país, com sugestões sobre como enfrentar a realidade da cidade pós-pandemia da Covid-19.

 

Abaixo, um panorama de Paraisópolis e acima os grandes edifícios formando a grande São Paulo. Foto: Yasuyoshi Chiba/AFP

 

O manifesto acentua que, ao seguirem a diretriz, os gestores municipais priorizem “o bem estar social, em busca ao pleno atendimento ao saneamento ambiental, moradia digna e educação cidadã para todos(as)”.

 

O documento é assinado pelo Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (CAU/BR),  Associação Brasileira de Arquitetos Paisagistas (ABAP), Associação Brasileira de Ensino de Arquitetura e Urbanismo (ABEA), Associação Brasileira de Escritórios de Arquitetura e Urbanismo (AsBEA), Federação Nacional dos Arquitetos e Urbanistas (FNA), Instituto de Arquitetura do Brasil (IAB) e Federação Nacional de Estudantes de Arquitetura e Urbanismo do Brasil (FeNEA).

 

A Carta foi elaborada a partir do ciclo de debates virtuais “Novas Cidades 2021”, promovido em julho e agora será entregue às lideranças partidárias e aos futuros candidatos, em processo de definição nas convenções que irão até 16 de setembro.

 

Na promoção do bem estar social, o saneamento ambiental precisa ser tratado como direito fundamental. Essa premissa, apresentada em quase todos os debates, foi reforçada pela arquiteta e urbanista e pesquisadora da Fiocruz Simone Cynamon.  Para ela, “é inconcebível que pessoas ainda vivem em sub-habitações e sem saneamento”.

 

Arquiteta e urbanista Simone Cynamon

 

A arquiteta propõe que os municípios pensem seus Planos Diretores de forma mais globalizante e integradora fazendo com que a política de saúde coletiva das cidades dialogue com as políticas urbana, habitacional, de meio ambiente e saneamento. “A cidade pós-pandemia é um problema muito completo que não adianta só um setor resolver.”

 

No ciclo de debates ficou evidenciado que a pandemia da Covid-19 exacerbou as desigualdades sociais nas cidades. Na visão da sanitarista e pesquisadora na área de Saúde, Karine Santana, para que o planejamento urbano melhore a qualidade de vida das pessoas no pós-pandemia é preciso “incorporar a interseccionalidade, considerando a diversidade da população e os grupos mais vulnerabilizados, sobretudo pela falta de saneamento básico e precariedade das habitações.”

 

Sanitarista e pesquisadora em Saúde, Karine Santana

 

 

A arquiteta e urbanista e professora da Universidade de Brasília, Luciana Saboia avalia que o saneamento perpassa várias questões, sendo absolutamente fundamental como política de Estado e não de governo. “Ao falar de saneamento, remeto a todas as questões de paisagem e a exigência de um planejamento integrado e em todas as escalas, desde a habitação”. A arquiteta entende que a água deve ser pensada como um movimento que pode ser uma reestruturação do que chamamos de “infraestrutura verde”, das conexões ambientais e dos biomas.

 

Arquiteta e urbanista Luciana Saboia

 

Políticas públicas que promovam o bem estar das pessoas precisam garantir o acesso ao saneamento. “Todos já ouviram aquela história de que saneamento não dá voto porque vai para debaixo da terra. Acho que isso já é passado. Todos têm que ter água potável e isso é uma questão de saúde pública”, afirmou a deputada federal Carmen Zanotto (Cidadania/SC), durante debate que discutiu um grave problema escancarado com a pandemia: milhares de moradores de favelas não podem aderir às recomendações de higiene durante o isolamento, porque não têm acesso à água potável.

 

 

Deputada Federal Carmen Zanotto

 

 

Para Simone Cynamon o grande desafio para a redução dessas desigualdades é garantir o acesso à água segura e ao saneamento como direito humano básico. Aliado a isso, os palestrantes apontaram outros direitos fundamentais que precisam ser priorizados para trazer o cidadão para o centro das decisões políticas, como por exemplo, a educação.

 

 

Líder do MTST/SP Carmem Silva

 

 

O direito a viver na cidade, passa essencialmente pelo direito à saúde, moradia, mobilidade, meio ambiente, cultura e educação, na avaliação da líder do Movimento dos Sem-Teto do Centro (MSTC) de São Paulo Carmem Silva. “Precisamos de uma educação cidadã”.  Opinião corroborada pela deputada federal Ângela Amin (PP/SC), que defende um processo mais democrático, com mais participação popular e inclusão, que será alcançado por meio da educação, definida por ela como uma questão de direito à vida com qualidade.

 

 

Deputada Federal Ângela Amin

 

 

As incongruências das moradias também estão mais evidentes na pandemia. Relatos dos debates revelaram comunidades que enfrentam desde a precariedade das construções, com moradias onde residem mais de uma família, até a falta de infraestrutura em seu entorno.

 

Alguns territórios não usufruem de políticas públicas e muitos dos seus habitantes sequer possuem identidade ou o mais óbvio dos direitos. Nesse momento de pandemia, somente a solidariedade de seus pares tem evitado a fome e miséria, já que as políticas públicas não chegam a essas localidades.

 

A pandemia, segundo Carmen Silva, veio reverberar o que os movimentos sociais “sempre gritaram: tudo passa pela moradia”. “É necessário que o poder público enxergue os territórios de favela como parte da cidade, conectando-os às diversas redes de infraestrutura urbana, e não apenas como um problema de segurança pública”, acredita a educadora e historiadora Pâmela Carvalho.

 

 

 

A educadora e historiadora Pâmela Carvalho

 

Para isso, é necessário conhecer e considerar as particularidades de cada território onde se pretende atuar, bem como da população que nele reside “por meio de censos, pesquisas, e parcerias entre a sociedade civil organizada e o setor público, possivelmente com o apoio das universidades públicas. A partir daí, pensar em metodologias próprias para cada contexto local”, sugere Pâmela Carvalho.

 

“Não devemos esperar uma nova pandemia para criar programas de reformulação e de reurbanização que atendam as comunidades. Mas esses programas e iniciativas não podem sair de uma caixinha e de um modelo já preparado, que em sua maioria não se encaixa na nossa realidade. Cada comunidade tem suas especificidades e quer dar sua contribuição”, ressalta o líder comunitário de Paraisópolis/SP Gilson Rodrigues.

 

 

O líder comunitário Gilson Rodrigues

 

 

Outra prioridade para a promoção do bem estar, segundo vários debatedores, é o transporte. Visto na pandemia como vetor de transmissão do coronavírus, o transporte público, especialmente o ônibus, teve suas deficiências expostas e precisa passar por uma reformulação para ser ofertado de maneira segura e eficiente.

 

 

“A mobilidade deve ser um meio, uma forma de acesso e não uma grande engrenagem de linhas e destinos fixos, como se as pessoas não circulassem de maneira orgânica pelo território da cidade”, explicou a arquiteta e urbanista e gerente de Políticas Públicas do ITDF Brasil, Letícia Bortolon.

 

 

Arquiteta e urbanista Letícia Bortolon

 

Para que a mobilidade seja uma solução para os problemas do transporte público nas cidades, o deputado federal Gustavo Fruet (PDT/PR) propôs que a vias sejam redesenhadas, os espaços compartilhados, a redução da velocidade e investimentos em ciclovias e calçadas. Já o líder comunitário Henrique Silveira sugeriu que a remuneração do transporte público seja por custo de operação e não pelo número de viagens e que se intensifique a fiscalização do setor e o planejamento dos municípios para a área, possibilitando a criação de receita extra tarifária para financiar o sistema.

 

 

Deputado Federal Gustavo Fruet

 

As propostas apontam para um único caminho: assegurar a igualdade de oportunidades para todos. Essa é uma das diretrizes da Terceira Conferência das Nações Unidas sobre Moradia e Desenvolvimento Urbano Sustentável, a Habitat III, que recomenda também transformar as cidades em ambientes sustentáveis em todos as dimensões: social, econômica e ambiental; num lugar onde “ninguém seja deixado para trás”.

 

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