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Dia da Consciência Negra: ações do CAU buscam combater discriminação e exclusões

As cidades são territórios coletivos e controversos. Na busca pela igualdade social, política, econômica e cultural, um projeto de cidades mais inclusivas e diversas deve garantir a todas as pessoas o direito de circular, ocupar, vivenciar, ter segurança, visibilidade e participação ativa em suas construções.

 

No mês do Urbanismo e da Consciência Negra, é urgente refletir sobre as possíveis contribuições da Arquitetura e do Urbanismo para combater todas as formas de discriminação e exclusão da população negra nas cidades, além de ampliar o olhar para as questões de gênero, deficiência, idade, etnia, crença, orientação sexual, parentalidade, dificuldades de locomoção e quaisquer outros marcadores que se interseccionem configurando vulnerabilidades.

 

AÇÕES DO CAU

 

Até 2020, não havia informações raciais na base de dados do CAU, não sendo possível aferir a representatividade de profissionais negros e negras no conselho. Esse levantamento só foi possível a partir de uma iniciativa da então Comissão Temporária de Equidade de Gênero, instituída entre 01/05/2019 e 30/04/2020, que solicitou a inclusão de pergunta sobre raça no II Censo dos Arquitetos e Urbanistas do Brasil, realizado em 2020.

 

A pesquisa, realizada periodicamente como subsídio para o planejamento estratégico da autarquia, contou com a participação de aproximadamente um quarto dos profissionais ativos e demonstrou que, enquanto negros e negras correspondem a 55% da população brasileira (1), na Arquitetura e Urbanismo, são somente 22% dos profissionais (2). 

 

Com esses dados, confirmou-se a necessidade de ampliar as ações do CAU para além das questões de gênero, para que a sua missão de promover Arquitetura e Urbanismo para Todas e Todos , sem distinção, seja efetivamente cumprida.

 

Se incluir a perspectiva de gênero na profissão implica em desconstruir a visão dos profissionais de Arquitetura como um grupo universal e entender as assimetrias entre os homens e as mulheres na prática profissional, apresentar uma leitura homogênea do conjunto de mulheres é igualmente limitador e redutivo. Longe de serem uma problemática binária e estruturada em categorias unidimensionais, as inequidades de gênero são problemas complexos e multicausados que, por consequência, requerem soluções também complexas e multidimensionais.

 

 

Dessa forma, o conselho criou, em 27 de agosto de 2021, a Comissão Temporária de Raça, Equidade e Diversidade (CTRED), coordenada pelas arquitetas e urbanistas negras Cláudia Sales de Alcântara (conselheira federal titular pelo Ceará) e Camila Leal  (conselheira federal titular pela Paraíba).

 

COMPOSIÇÃO DA COMISSÃO

 

 

O intuito da Comissão é trabalhar de forma transversal com os órgãos colegiados e as instâncias do CAU para que a pauta possa permear todas as ações do conselho, seja em sua estrutura e instrumentos institucionais, como no seu relacionamento com a sociedade.

 

A 118ª Plenária do CAU Brasil, na véspera do dia 20 de novembro, foi iniciada com palavras da Presidente Nadia Somekh sobre a data: “O Dia da Consciência Negra, na data da morte de Zumbi dos Palmares, é celebrado desde 2011 por obra do gaúcho Oliveira Silveira, que lutou 50 anos para que isso acontecesse. Nas palavras de Djamila Ribeiro, foi a ancestralidade negra que construiu esse país, junto com a indígena, e ela deve ser sempre saudada. Quero registrar que eu tenho muito orgulho de termos criado uma Comissão de Raça, Equidade e Diversidade. Temos pouca coisa para celebrar, mas estamos contribuindo para que quem construiu a riqueza desse país tenha também espaço no nosso conselho.”

 

Durante a reunião, como fruto da contribuição da CTRED ao trabalho da Comissão de Planejamento e Finanças do CAU/BR (CPFI), foi aprovada a concessão de descontos, durante os dois primeiros anos após a colação de grau, para egressos de universidades públicas ou privadas que ingressaram por meio de políticas afirmativas (raciais ou sociais), receberam bolsas integrais ou participaram de programas públicos de financiamento estudantil. Também foram previstas reduções nas anuidades para arquitetos ou arquitetas e urbanistas que estejam usufruindo ou tenham usufruído de licença parental, incluindo casos de perda da gestação e adoção.

 

Ambas as modalidades entrarão em vigor após a implementação das funcionalidades no SICCAU em 2022, para início em 2023. A Coordenadora adjunta da CTRED e membro da CPFI, conselheira Camila Leal, declarou emocionada: “Tenho muito orgulho de nesse momento tão difícil poder estar no CAU Brasil pautando o debate de raça, gênero e diversidade e construindo ações afirmativas que valorizem a atuação de profissionais negros e negras em todo o país. É muito simbólico ter aprovado um desconto para egressos cotistas justamente na véspera do Dia da Consciência Negra. Apesar de ouvir falas que querem dizer que este não é o meu lugar, tenho certeza de que esse foi o primeiro de muitos passos que virão no sentido de tornar o Conselho um espaço no qual pessoas como eu se sintam pertencentes.”

 

Essa percepção tem acontecido de forma coletiva e os debates sobre gênero, raça, diversidade e inclusão têm sido absorvidos também pelos CAU/UFs. Pelo menos dez estados possuem Comissões instituídas e há diversas iniciativas regionais em curso, como o “Ciclo de Debates: cidade, arquitetura e negritude” promovido pelo CAU/CE em celebração ao Dia da Consciência Negra de 2021.

 

A conselheira federal pelo Estado do Ceará e coordenadora da CTRED, Claudia Sales afirma: “Dizer que descontos para grupos minoritários são assistencialistas e privilegiam quem não sustenta a autarquia é muito complicado em um contexto tão desigual como o brasileiro. Não é o princípio da Igualdade e sim o da Equidade que deveria ser o balizador das nossas decisões e nossas legislações, porque é sempre uma parcela pequena de profissionais que têm condições de pagar as anuidades e os RRTs. Nós temos pontos de partidas muito distintos e esses outros profissionais, que são tão importantes quanto nós que pagamos a anuidade, precisam de ações afirmativas para terem condições de contribuir e apoiar a constituição deste conselho. Com essas políticas de médio a longo prazo daremos condições para que essas pessoas se enxerguem e se reconheçam no CAU e sintam que de fato valeu a pena investir seu dinheiro e ser representado por ele.”

 

Um exemplo claro da necessidade de um olhar interseccional para os números da profissão é o cruzamento de dados de gênero e renda mensal individual. Quanto maior a faixa salarial, menor é o percentual de mulheres e maior o de homens. Combinando esses dados a informações raciais, é possível ver que as mulheres pretas sequer aparecem na faixa de mais de 15 salários mínimos.

 

O Censo de 2020 também confirmou o resultado do 1º Diagnóstico ‘Gênero na Arquitetura e Urbanismo’: a média salarial dos homens brancos (R$ 5.590,00) é quase o dobro das mulheres pretas (R$ 2.888,00). Para elas, que representam apenas 6% dos arquitetos e urbanistas, o próprio acesso e permanência na profissão são os maiores obstáculos. Para a vice-presidente do CAU Brasil, Daniela Sarmento: “Avançamos ao entender a necessidade das políticas afirmativas para trazer para o CAU quem não está nele e valorizar quem já está. Temos o compromisso de dar continuidade ao desenvolvimento dessas políticas e ele não se encerra por aqui.”

 

 

 

NOTAS:

  1. (46% pardos e 9% pretos, conforme dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) referentes ao primeiro trimestre de 2021, obtidos em: sidra.ibge.gov.br, acesso em 6 junho 2021.
  2. 18% pardos e 4% pretos. 45383 profissionais (aproximadamente 25% dos profissionais ativos à época) responderam 45 perguntas do Censo do CAU por meio de seus acessos pessoais ao Sistema de Informação e Comunicação do CAU (SICCAU) entre 02/01 e 30/06/2020. A pesquisa está em fase final de tabulação, com previsão de lançamento ainda este ano

 

Texto de Ana Laterza, arquiteta e urbanista, assessora da Presidência do CAU Brasil, e Camila Leal, arquiteta e urbanista, conselheira federal do CAU pela Paraíba

 

 

 

 

 

 

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