Lei de Licitações

Senado autoriza estatais contratarem obras sem projeto. CAU/BR pedirá veto

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O Senado Federal aprovou em 21/06/16, o projeto da  chamada “Lei de Responsabilidade das Estatais, que inclui autorização para as  cerca de 150 estatais da União, 70 dos Estados, nove do Distrito Federal e dezenas ligadas a Municípios, contratarem obras e serviços de engenharia sem projeto. A permissão é válida também para as sociedades de economia mista e subsidiárias.

 

O documento segue para o Palácio do Planalto, para sanção, total ou parcial. O CAU/BR e o SINAENCO (Sindicato da Arquitetura e Engenharia Consultiva) defenderão junto à Presidência da República o veto parcial com a exclusão da “contratação integrada” da futura lei. Se houver algum veto, o PLS 555/2015 (que na Câmara tramitou como PL No. 4918/2016) retornará ao Congresso, onde deputados e senadores poderão derrubá-lo por maioria absoluta.

 

A autorização se fez com a incorporação da “contratação integrada” entre os regimes de licitação a serem utilizados pelas estatais e empresas nas quais o Estado tenha participação. Nessa modalidade, a contratação é realizada apenas com base em um “anteprojeto de engenharia” apresentado pelo contratante. Tudo o mais, fica por conta da empreiteira contratada. Ou seja, “a elaboração e o desenvolvimento dos projetos básico e executivo, a execução de obras e serviços de engenharia, a montagem, a realização de testes, a pré-operação e as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto”, como especifica o documento.

 

“É espantoso que mesmo depois de tantas suspeitas e comprovados fracassos, o Congresso siga defendendo o regime de ‘contratação integrada’, ignorando completamente o atual momento institucional que o país vive, com ênfase na defesa da restauração de princípios éticos no tratamento da coisa pública”, afirma o presidente do CAU/BR, Haroldo Pinheiro. Em 2014, o CAU/BR e todas as principais entidades de Engenharia, Arquitetura e Urbanismo do país (como IAB, FNA, SINAENCO e CONFEA) assinaram o documento “As obras públicas e o direito à cidade”, de 2014,  com críticas ao RDC.“A experiência demonstra que o projeto completo e elaborado independentemente do construtor é condição indissociável de uma boa obra, de menores prazos e menores preços. Quem projeta, não constrói”, diz o texto.

 

HERANÇA DA PETROBRÁS – A “contratação integrada” foi introduzida no Brasil justamente através de uma estatal hoje em evidência no noticiário das ações da Operação Lava Jato: a Petrobrás. Mais claramente por meio do regime simplificado de licitações da estatal, com regras específicas fixadas pelo Decreto 2.745/98, já declarado inconstitucional pelo Tribunal de Contas da União, por prejudicar o controle externo e poder facilitar a prática de ilícitos, conforme afirmou o ministro Vital do Rêgo, relator do caso, em junho de 2015. O assunto segue pendente de decisão do Supremo Tribunal Federal.

 

Em 2011, a “contratação integrada” foi introduzida na legislação licitatória do país, passando a conviver em paralelo com a Lei de Licitações (8.666/1993), através da Lei 12.462, que instituiu o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC). O propósito inicial era dar agilidade e controlar os custos das obras do “legado da Copa” de 2014 e dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016. Nem uma coisa nem outra ocorreu, algumas obras da Copa nem foram concluídas, como o VLT de Cuiabá, mas mesmo assim o uso do RDC foi estendido aos poucos para as obras federais do PAC, do SUS, do DNIT, de estabelecimentos penais e outras.

 

O projeto da Lei de Responsabilidade das Estatais define a “contratação integrada” como “obra serviço de engenharia de natureza predominantemente intelectual e de inovação tecnológica do objeto licitado ou se puderem ser executados com diferentes metodologias ou tecnologias de domínio restrito no mercado”.

 

“Ou seja, as mesmas argumentações previstas na lei do RDC, o que não impediu o uso da “contratação integrada” para obras que não se encaixam em nenhum desses conceitos. Na verdade, um jogo de conceitos que esconde o real objetivo: a contratação de obra pública só com base em anteprojeto, deixando  o caminho aberto para o aumento dos custos, não cumprimento dos cronogramas, diminuição da qualidade e facilitação da corrupção nos contratos de obras públicas”, enfatiza Haroldo Pinheiro, presidente do CAU/BR.

 

O PL 4918/2016 também estipula que, para evitar problemas posteriores, na fase de execução de uma obra ou serviço por meio de contratação integrada, “sempre que o anteprojeto da licitação, por seus elementos mínimos, assim o permitir, as estimativas de preço devem se basear em orçamento tão detalhado quanto possível”. Algo que, segundo Haroldo Pinheiro, por ser vago demais, não significa objetivamente nenhum avanço, inclusive porque o texto especifica que nas contratações integradas “os riscos decorrentes de fatos supervenientes à contratação associados à escolha da solução de projeto básico pela contratante deverão ser alocados como de sua responsabilidade na matriz de riscos”. Ou seja, “o parâmetro orçamentário, no final das contas, quem dá é a empreiteira contratada, e não o poder contratante”, diz o presidente do CAU/BR.

 

CONTRATAÇÃO SEMI-INTEGRADA – O projeto da Lei de Responsabilidade das Estatais inova ao criar o regime de “contratação semi-integrada”, correspondente “a elaboração e o desenvolvimento do projeto executivo, a execução de obras e serviços de engenharia, a montagem, a realização de testes, a pré-operação e as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto”.

 

Ou seja, nesse caso, ao invés de apenas um anteprojeto, o contratante se obriga a apresentar no edital da licitação o projeto básico do empreendimento.

 

Contudo, o PL 4918/2016 permite alterações do projeto básico, “desde que demonstrada a superioridade das inovações em termos de redução de custos, de aumento da qualidade, de redução do prazo de execução e de facilitação de manutenção ou operação”.  O que, segundo o presidente do CAU/BR, é pouco factível, “até porque o interesse maior da empreiteira é gastar o mínimo, sim, mas para ganhar o máximo – o que não deixa de ser legítimo para uma empresa privada”.

 

O PL 4918/2016 é de autoria de Comissão Mista do Congresso, instituída pelo presidente do Senado, Renan Calheiros, e pelo então presidente da Câmara, Eduardo Cunha. Ela tomou como base o PLS 555/2015, de autoria de Renan Calheiros, que o incluiu na chamada “Agenda Brasil”, uma série de propostas apresentadas à Dilma Rousseff, e recentemente reapresentadas a Michel Temer, com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento econômico do país.

 

Em sua fase final de debates, nos plenários da Câmara e do Senado, os deputados e senadores se preocuparam apenas em ajustar as regras de nomeação de dirigentes das estatais. Para ser aprovado pela Câmara, entre outras concessões acordadas com o governo, foi retirado do texto o artigo que obrigava políticos e sindicalistas a passarem por uma quarentena de 36 meses antes de assumirem qualquer posto nas estatais.

LEI GERAL DE LICITAÇÕES –  Sancionada a lei, o Brasil passará a ter, mesmo que isso pareça paradoxal, duas legislações que tratam de licitações. Uma para as obras públicas em geral, da administração direta, outra específica para as estatais e empresas de economia mista. A Lei Geral de Licitações (8.666/1993) encontra-se em processo de revisão também no Senado. Em sua última versão, ela prevê a “contratação integrada” apenas para obras acima de R$ 500 milhões. Não se sabe, agora, com a aprovação do PLS 555/2015, se os senadores tomarão decisão semelhante ao projeto das estatais.

A revisão começou a ser estudada em 2013, mas o governo tem pressa em decidir o assunto. Em 20/06/2016, por meio da Portaria No. 1080, o Ministro da Transparência, Fiscalização e Contrôle, Torquato Jardim, instituiu Grupo de Trabalho “com a finalidade de formular propostas acerca da revisão e aperfeiçoamento da legislação referente a licitações e contratos”. Conforme negociado com o governo, o Senado deverá aguardar esse estudo para prosseguir com sua revisão.

Para completar o quadro confuso sobre o assunto dentro do Congresso, o presidente do Senado anunciou há poucos dias  que criará  um grupo de parlamentares para estudar soluções para concluir obras inacabadas do governo. Em paralelo, na Câmara dos Deputados acaba de aprovar a constituição de uma Comissão para analisar as obras do governo federal custeadas com recursos do orçamento da União. Há poucos dias, a Comissão ouviu  técnicos do Tribunal de Contas da União (TCU) e da Controladoria Geral da União (CGU) para debater a situação das obras paralisadas e a medidas para evitar maiores prejuízo.

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Publicado em 20/06/2016, atualizado em 21/06/2016

0 resposta

  1. Estamos vivenciando o momento da insignia da insensibilidade dos nossos políticos que continuam dos mesmos modos operantes.

  2. Parabéns CAU/BR, excelente iniciativa contra tantos erros e falta de ética nas políticas públicas. A CAU/BR é responsável e preocupada com os rumos do Brasil.

    1. Segundo o TCU e o Senado existem cerca de 20 a 30 mil obras paradas no país por causa de irregularidades, imagine uma lei descente em vigor que pudesse retomar estas obras e o número de empregos que geraria num momento tão delicado como estamos vivendo?

    2. Pois é, um absurdo! Querem rapidez para quê?
      Para chegar mais rápido aos problemas? Daqui a pouco vamos voltar para à época das trevas e resolver tudo na força.
      Estamos vivendo uma época onde a ciência, a técnica, o método e o licenciamento são vistos como instrumentos autoritários e burocratas.

  3. A mafia das licitações terá mais força!!
    Um grande absurdo!
    Mesmo com tantas evidências que estão sendo encontradas com a Operação Lava Jato entre outras, o Senado deixa essa questão nas “entre linhas”, chamando dos Brasileiro de tolos…

    Precisa acabar também com o RDC!!

  4. Prezado senhor Sabat – no ano que vem completo 30 anos de trabalho em empresa pública, portanto o conteúdo de cada etapa de projeto e as exigências da lei me são familiares. O anteprojeto, por exemplo, não se resume às ideias iniciais, mas consiste na concepção do objeto em todas as disciplinas de projeto (Lei 12.462/2011 e Decreto 7.581/2011, Art. 74). Poderia esclarecer outros pontos da resposta, mas limito-me a lamentar que o órgão representante da classe tenha adotado visão superficial da situação, desconsiderando aspectos de fato positivos da inserção do RDC no elenco de possibilidades de licitação pública. Cordialmente.

    1. Você fala apenas pela sua empresa ou por todas? Porque essa lei se aplica a todas, inclusive aquelas pagadoras de propina. Mais uma coisa, as obras realizadas via RDC foram um sucesso? Ampliando, as obras públicas no Brasil são um exemplo de qualidade, pontualidade e rigidez orçamentária?

  5. Como engenheiro civil, fico estarrecido e envergonhado com o fato do CONFEA e CREAs não se juntarem ao CAU/BR e SINAENCO para vetar esta lei. Licitar uma obra sem projetos, é melhor contratar uma cartomante para fazer o “orçamento”.

  6. Enquanto o CAU se esforça tanto para a publicidade negativa dos arquitetos em relação à RT, deveria sim se mobilizar fortemente contra à RDC! Cade a campanha publicitária contra a RDC?? Por que não vemos uma matéria sobre isso nos jornais todos os domingo?
    Não vêem que discussões, conversas, participação em eventos junto ao Congresso não vai resolver nada?

    Agora para prejudicar a imagem do arquiteto aí sim sai todo domingo no jornal de maior circulação em Belém… O CAU só gasta dinheiro para prejudicar a nossa imagem!

    1. Mirza, conheça a campanha publicitária do CAU contra o RDC, com anúncios em jornais e revistas: http://www.caubr.gov.br/?p=57220

      Além da campanha publicitária, o presidente Haroldo Pinheiro publicou artigos nos maiores jornais do país e fez várias palestras no Congresso Nacional sobre o tema. Essa não é a primeira tentativa de ampliar o uso do RDC, e temos conseguido sucesso nessa luta até agora. A participação dos arquitetos por um Brasil mais ético é fundamental, contamos com a colaboração de todos!

  7. Poderia-se aproveitar as festas de São João e fazer bandeirinhas, balões, e uma enorme fogueira com os projetos de arquitetura. Isso tudo na frente do congresso. Já que os projetos não servem pra nada, vamos dar um uso pra eles. E quando a fogueira estiver baixa, pegaremos todos os projetos das prefeituras e aí vamos ver como elas vão cobrar o IPTU sem projetos completos.

  8. Pois é. O Brasil virou o país dos advogados. Tudo o que eles dizem é lei…enquanto perdurar essa cultura, estaremos rendidos e entregues ao Deus dará! Nossa Senhora do Concreto Armado que nos guarde!

  9. No mundo todo se prioriza os projetos e planejamento das obras.
    Depois de tudo exaustivamente discutido é que se parte para a execução das obras.
    Com essa atitude quase que não ha pleitos nem aditivos contratuais.
    Muito menos o absurdo da obra custar 2, 3, 10 vezes o valor originariamente orçado.
    Mas, aqui é o contrario.
    Porque esta é a porta da corrupção.

  10. Concordo com o Colega Marco Perin (SP), o CAU-BR precisa sair do ostracismo e vir a publico apresentar essas manobras escusas, não basta atuar “firmemente na discussão sobre a obrigatoriedade do projeto completo, participando de diversos eventos no Congresso Nacional e conversando diariamente com deputados e senadores”. O Congresso é CORRUPTO e somente vamos conseguir barrar esses absurdos se divulgarmos e mobilizarmos a sociedade em defesa de um pais melhor.

  11. Hoje o governo já anuncia mudanças na lei de licitação, será mais uma excrescência que vêm por aí?

  12. A aprovação desta lei é um tremendo retrocesso, disfarçado de desburocratização. O que imperra e atrapalha a velocidade da aprovação e execução dos projetos são as LICENÇAS e ALVARÁS. Estes sim, precisam ser revistos.

  13. TRATA-SE DE MAIS UMA MANOBRA POLÍTICA PARA FAVORECER A CORRUPÇÃO E O DESPERDÍCIO DO DINHEIRO PÚBLICO, SEM CONTAR QUE ISTO GERA UM TOTAL DESFORECIMENTO DA CLASSE DE ARQUITETOS(A) E ENGENHEIROS(A) DENTRE OUTROS.
    “A EMPRESA PÚBLICA E OU ESTATAIS DEVEM SIM SE SUBMETER AOS MESMOS CRITÉRIOS DAS EMPRESAS PRIVADAS”.

  14. Não sei porque o CAU não “sai do ostracismo” e vem público, ocupando seu espaço na sociedade civil e faz uma campanha sobre este tema…
    Será que interesses corporativos, medo de perda de alguns contratos com as construtoras, etc. falam mais alto?
    Não o sentido nesta ‘conversa de arquiteto arquiteto’…
    E se este Conselho não se sente apto a encarar uma discussão destas num clima tão favorável, mediante a tantos escândalos, quando é que irá nos representar??

  15. As mudanças necessárias só ocorreram quando as classes de todas as profissões relacionadas à Arquitetura e Engenharia se unirem para pressionarem o Congresso.

  16. Como ficou difícil operar a corrupção pelo modo clássico, como vinha sendo feito; então “os caras” trataram de inventar outra forma ou formato camaleônico de operar a corrupção.
    Até meu cachorrinho já sabe no que isso vai dar:
    Obras e Construções de Qualidade/Segurança = ZERO.

  17. Creio que a CAU BR deva se pronunciar a respeito das consequências nefastas dessa aprovação da PL 4918/2016! , junto aos Exmos. Senhores Deputados e Senadores!
    Sem contar que coloca a profissão de Arquitetos e Engenheiros em risco ou cúmplices das nefastas consequências futuras!

    1. Elcio, a posição do CAU/BR está expressa na matéria acima. A assessoria parlamentar do CAU/BR já está em contato com os senadores para tratar deste tema.

  18. Prezada Francis,
    Se vc sem manjar de obras ja pensa assim, imagine se soubesse de quanto se pode desviar usando o RDC.

  19. Cabe um pequeno ajuste na chamada da matéria, pois o RDC não prevê contratação de obra sem projeto. É sempre exigido, dependendo do caso, anteprojeto ou projeto básico – que se constituem em projeto de engenharia. A reportagem portanto deveria apresentar o título “Lei das estatais permitirá a contratação de obras sem projeto executivo” – o que representa relevante diferença. Grata.

    1. Prezada Viviane,
      O conhecimento das metodologias de gerenciamento de obras estabelece uma serie de critérios na evolução de um projeto de ideia até a entrega do produto.
      Basicamente o que o RDC estabelece que o ante projeto (ou seja apenas as ideias iniciais do que se quer)deve ser fornecido pelo contratante. as demais etapas do projeto, estudo e projeto básico, projeto executivo bem como construção e montagem podem ser licitados e a empreiteira ganhadora leva tudo. Isso é uma mão na roda pra atos desonestos, quase um incentivo. è como vc desejar um projeto para construir um FUSCA, licitar e o empreiteiro te entregar um CIVIC e te cobrar uma FERRARI.

  20. Não sou engenheira, nem arquiteta, nem mestre de obras.
    Apenas o meu bom senso que me diz que isso é um absurdo, e que sem dúvida não só cheira a falcatrua, como uma total falta de responsabilidade por parte desses senhores, que fazem leis e as aprovam.

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